Como não podemos deixar de
pensar, pois nossa mente não dorme nem para, vamos tecendo um emaranhado de
ideias, informações, preocupações, dúvidas e projetos, cujo arquivo vai
crescendo e fugindo de nosso controle. Especialmente nos dias atuais, em plena
era da comunicação, com todo o bombardeio a que somos submetidos pelos novos
mecanismos tecnológicos, os apelos ao consumismo e outras necessidades que
inventamos ou que nos vêm através das burocracias sociais, econômicas e políticas.
Nessa agitação toda,
nos perdemos na organização de nosso universo individual, que demanda o
estabelecimento de uma ordem prioritária para o atendimento aos diversos papéis
que desempenhamos nos meios em que vivemos.
Tudo seria mais fácil
se tivéssemos uma estrutura da qual fôssemos conscientes e que nos facilitasse
o direcionamento de nossas ocupações mentais, atendendo a nossas necessidades e
anseios, desde os aspectos fisiológicos até os que dizem respeito a nosso
psiquismo, englobando as emoções, o afeto, a espiritualidade.
No entanto, essa
estrutura não existe, pelo menos qualificada o suficiente para nos proporcionar
bem-estar e segurança. Por que não?
Primeiro porque não nos
treinamos para isso. Na maior parte do tempo, deixamos as coisas acontecerem e
nos afetarem, postergando muitas vezes sua solução, e contraindo com isso o
vírus do stress.
Depois, não definimos
claramente departamentos em nosso psiquismo para onde triássemos as novas
ideias e informações, ou simplesmente rejeitássemos as inconvenientes. Deixamos
que se acumulem registros importantes misturados aos fúteis e, pior, aos
nocivos. Com isso surgem as interferências, as interpretações equivocadas, os
conflitos, constituindo uma plataforma emocional nem sempre positiva.
Entre as causas dessa
situação, talvez a principal seja o fato de não nos conhecermos. Não sabemos de
nossa origem, nossos objetivos, desconhecemos os motivos e a finalidade por que
vivemos. Ignoramos, enfim, nossa identidade. Como, então, organizar e controlar
o enorme e ininterrupto fluxo de pensamentos e informações sem esses
parâmetros?
Acumulamos na memória
muitas coisas desnecessárias, lembranças ruins ou inteiramente dispensáveis. Damos
importância exagerada, quase exclusiva, ao mundo objetivo, ao futuro, buscando ou
esperando fora de nós a solução para nossas deficiências e a satisfação de
nossos desejos, à maneira do extrativista, com insaciável sede e fome de
novidades.
Esquecemo-nos. Não nos
ouvimos, não conversamos com nós mesmos, não nos abraçamos, não nos sorrimos,
não nos amamos.
A partir do
autoconhecimento, nossa relação com o mundo, com as pessoas e com os
acontecimentos teria forma e dimensões significativamente diferentes, e
melhores.
Melhoraríamos nossa capacidade
de escolha, mudando o modo pelo qual os acontecimentos nos afetam e focalizando
nossa atenção naquilo que realmente nos interessa.
Cuidaríamos mais de nossa
defesa, filtrando as interferências, qualquer que seja sua fonte, impedindo que
nos desrespeitem. Afinal, quem cuida de nós somos nós, e é de nosso interesse
preservar nossa integridade, com saúde física, mental e emocional.
Devemos investir mais em nosso
desenvolvimento intelectual, moral, espiritual, aproveitando melhor o tempo e a
oportunidade que a vida nos oferece para nosso aperfeiçoamento.
Felizmente, agora, a própria
Medicina nos recomenda cuidados que vão além da saúde puramente física, como a
leitura frequente, o lazer, os exercícios físicos e mentais. No entanto, está
muito aquém de atender às múltiplas necessidades dos seres tão complexos que
somos.
Estamos, porém, em construção.
Pensadores, estudiosos e pesquisadores constantemente contribuem para ampliar
nossa percepção de nós mesmos, e a descoberta de que obedecemos a um plano –
inteligente, obviamente – cujo objetivo é nossa realização, nossa completude.
Iniciamos, assim, a base do
autoconhecimento. Por enquanto, utilizamos o conhecimento objetivo para esse
propósito, até que consigamos construir a estrutura acima referida, a partir da
qual, saberemos aproveitar todas as fontes de informação, principalmente em
nossas relações sociais, assimilando os elementos que nos satisfaçam, ao mesmo
tempo em que contribuiremos para o crescimento de todos a nossa volta.
Habituemo-nos a viajar para
dentro de nós mesmos, buscando conhecer nossos sentimentos, nossas qualidades, valores
e conquistas. Driblemos nossa mente viciada e dominada pelos interesses
imediatos do materialismo e procuremos desvendar nossos próprios segredos. Não
sejamos estranhos a nós mesmos. Não nos evitemos, e sim nos aproximemos,
tornando esse ser nosso melhor amigo, alguém a quem realmente amamos.